Caracterização do Perfil de Controlo Postural em Idosos através de Métodos Não Lineares

10-09-2011 10:52

Resumo

Este estudo teve como objectivo caracterizar o perfil de Controlo Postural em Idosos relativamente a medidas estocásticas das oscilações do Centro de Pressão e quanto à Base de Suporte (BOS). A amostra consistiu em 75 participantes  52 mulheres (idade 68 ± 7 anos, altura 155 ± 7 cm; peso 67 ± 11 Kg) e 23 homens (idade 69 ± 5 anos, altura 168 ± 5 cm; peso 75 ± 7 Kg), onde 40 são praticantes de Exercício Físico (PEF) do Projecto Saúde em Movimento da Câmara Municipal de Lagos e 35 correspondem a indivíduos sedentários (NPEF).

Foi efectuada uma avaliação posturográfica em apoio bipodal de olhos abertos e fechados através de uma plataforma de forças e calculadas a Entropia Aproximada (ApEn), Exponente Lyapunov (LyE), Área da BOS e Ângulo Formado entre os Pés (α BOS).

As principais conclusões deste estudo levam-nos a crer que os idosos praticantes de exercício físico do Projecto Saúde e Movimento apresentam uma ApEn e LyE mais elevados, indicador de um Controlo Postural mais complexo e potencialmente mais saudável. Por outro lado, as variáveis ApEn e LyE apresentam robustez a alterações da Área BOS e α BOS.

 

INTRODUÇÃO

O envelhecimento, encontra-se relacionado com o aumento da prevalência de doenças crónicas e incapacitantes que comprometem a independência funcional e a autonomia do idoso (Ramos, 2003). Segundo Spirduso, et al. (2005), com o avançar da idade verificam-se alterações em diferentes sistemas (sensorial, motor e cognitivo), que quando acumuladas afectam a capacidade de manter o corpo em equilíbrio. A perda destas capacidades tem sido associada ao aumento do risco de quedas em idosos, constituindo um grave problema de saúde na população sénior (Corriveau, Hébert, Prince, & Raîche, 2001).

Segundo Ricci, Gazzola, & Coimbra (2009), os idosos com historial de quedas apresentam uma capacidade reduzida para manter o Controlo Postural, quando comparados com idosos sem historial de quedas. Júnior & Barela (2006) realçam também a necessidade de um SCP eficiente, especialmente importante na redução de quedas da população sénior.

A prática de exercício físico regular parece ser responsável por melhorias no funcionamento do SCP em idosos, fruto de modificações na relação entre a informação sensorial e acção motora (Prioli, Freitas Júnior, & Barela, 2005).

De acordo com Grasso, Tarantola, Corna, & Schieppati (2000) a maioria das quedas na população idosa parece estar relacionada com uma resposta inadequada às perturbações externas. Assim, a quantificação da resposta do Controlo Postural torna-se fundamental na avaliação clínica do equilíbrio, demonstrando um elevado potencial na identificação e entendimento dos factores que contribuem para a perda de equilíbrio na população idosa (Horak, Henry, & Shumway-Cook, 1997).

Recentemente, na área da análise do movimento humano, destaca-se o interesse pelo estudo da variabilidade em diferentes aspectos do ser humano. Esta necessidade está relacionada com o facto do corpo humano comportar-se como um sistema não linear, organizado no domínio temporal (Glass & Mackey, 1988). As oscilações corporais decorrentes de séries temporais relativas à manutenção da postura erecta são apontadas como um ritmo fisiológico que está associado ao SCP, (Cavanaugh, Guskiewicz, & Stergiou, 2005). Alterações neste ritmo, para valores considerados anormais, bem como o aparecimento de novos padrões estão normalmente associados a doença (Glass & Mackey, 1988). Estas novas formas de avaliação do dinamismo fisiológico do corpo humano, torna possível distinguir ritmos normais de situações patológicas.

Pretendeu-se no presente estudo, caracterizar o perfil de Controlo Postural em idosos praticantes de Exercício Físico (PEF) do Projecto Saúde em Movimento e não praticantes de Exercício Físico (NPEF) do Concelho de Lagos, relativamente a medidas do Controlo Postural e da posição dos pés, na postura erecta não perturbada.

 

MÉTODOS

Sujeitos

75 participantes 52 mulheres (idade 68 ± 7 anos, altura 155 ± 7 cm; peso 67 ± 11 Kg) e 23 homens (idade 69 ± 5 anos, altura 168 ± 5 cm; peso 75 ± 7 Kg), onde 40 são praticantes de Exercício Físico (PEF) do Projecto Saúde em Movimento da Câmara Municipal de Lagos e 35 correspondem a indivíduos sedentários (NPEF). Foi efectuado um processo de amostragem por conveniência em dois grupos distintos.

Os PEF efectuam um mínimo de 2 sessões de exercício físico semanal com duração de 45 minutos onde são realizados exercícios com vista ao desenvolvimento da componente cardiovascular (através da marcha e aeróbica), da força (através de exercícios com peso corporal, resistência variável progressiva, resistência constante e pesos livres). Todas as sessões consideram o treino proprioceptivo (mediante a utilização de diferentes superfícies instáveis em condição quasi-estática e dinâmica), bem como uma rotina de alongamentos na fase de retorno à calma.

 

Critérios de inclusão

Idade superior a 55 anos;

Inexistência de patologias que comprometam o SCP;

Praticante das sessões do projecto Saúde em Movimento há pelo menos seis meses (grupo PEF);

Assiduidade de pelo menos 2 sessões semanais no projecto Saúde em Movimento (grupo PEF).

 

Recolha de Dados

Foi efectuado um registo da posição dos pés adoptada pelos participantes de forma a calcular a Área da Base de Suporte e o Ângulo e Afastamento dos pés. A recolha das posições dos centros de pressão nos eixos AP e ML foi efectuada através de uma plataforma de forças BERTEC CORPORATION num computador portátil Asus UL30A Processador SU7300 com o sistema operativo Windows 7 Premium e Software ACQ Digital Acquire 1.4.7.

Foi realizada uma prova experimental na posição bipodal estática com os olhos abertos. Posteriormente foram realizados dois testes na condição de olhos abertos e dois na condição de olhos fechados onde foi solicitado aos sujeitos que visualizassem uma referência circular com 5 cm de diâmetro colocada na frente da plataforma de forças à altura dos olhos.

 

Análise dos dados

A ApEn foi calculada através de uma rotina de MATLAB adaptada por Orlando Fernandes implementando a metodologia de Pincus (1991). Para o cálculo do LyE foi utilizado o Software Chaos Data Analyzer, versão 2.1 Profissional, desenvolvido por Sprott e Rowlands (1992) (https://webassign.net/pasnew/cdapro/cdapro.html). Neste software foram considerados os seguintes parâmetros apresentados por defeito: “Embebed dimensions”: 3, “# Steps”: 3 e “Accuracy” de 10-4.

Calcularam-se as variáveis Área da BOS e α BOS sugeridas por Chiari, et al. (2002) para cada uma das imagens, através de uma rotina de MATLAB ® (R2009B, versão 7.9.0.529 64-Bit, 12 de Agosto de 2009) preparada por Orlando Fernandes de acordo com as seguintes fórmulas Chiari, et al. (2002):

  

Análise Estatística

 

Foi aplicado o teste misto de medidas repetidas, onde foram avaliadas as diferenças entre género e hábitos de Prática de Exercício Físico nas medidas de Controlo Postural. Os factores entre-sujeitos foram Género (2 níveis: Masculino ou Feminino) e hábitos de Prática de Exercício Físico (2 níveis: PEF ou NPEF) e os factores intra-sujeitos foram a condição visual (2 níveis: com ou sem) e a componente (2 níveis: AP ou ML).

Foi efectuada a comparação das variáveis Área da BOS e α BOS entre Género e hábitos de Prática de Exercício Físico através do teste T para amostras independentes.

Foi estudada a associação entre as variáveis Área da BOS, α BOS e medidas de Controlo Postural através do coeficiente de correlação Ró de Spearman.

Foi considerado um nível de significância para a rejeição das hipóteses nulas, em todos os testes estatísticos aplicados, de p≤0,05, isto é, com um intervalo de confiança de 95%.

 

RESULTADOS

 

Entropia Aproximada

Não se verificou um efeito principal do Género F(1, 71) = 2.41, p = 0.125 ηp2 = 0.33, e ηp2 indica um efeito de tamanho pequeno a médio (Cohen, 1992). Assim sendo, se ignorarmos todas as outras variáveis, podemos considerar que a ApEn de sujeitos do género masculino não apresenta diferenças significativas quando comparada com sujeitos do género feminino.

Verificou-se um efeito principal da Prática de Exercício Físico F(1,71) = 5.94, P = 0.017 ηp2 = 0.77, onde ηp2 indica um efeito de tamanho médio a grande (Cohen, 1992). Segundo este efeito se ignorarmos as outras variáveis, podemos considerar que valores de ApEn do grupo NPEF podem ser significativamente diferentes daqueles apresentados pelo grupo PEF.

As maiores diferenças entre PEF e NPEF quanto à variável ApEn são no eixo ML para ambas as situações (0,16 para olhos abertos e 0,23 para olhos fechados). 

 

Expoente Lyapunov

Não se verificou um efeito principal do Género F(1, 71) = 1.33, p = 0.253 ηp2 = 0.18, para a variável LyE onde ηp2 indica um efeito de tamanho pequeno (Cohen, 1992). Este efeito diz-nos que se ignorarmos todas as outras variáveis, podemos considerar que valores de LyE de sujeitos do sexo masculino não apresentam diferenças significativas quando comparados com sujeitos do sexo feminino.

Verificou-se um efeito principal da Prática de Exercício Físico F(1,71) = 4.14, P = 0.046 ηp2 = 0.55, para a variável LyE, onde ηp2  indica um efeito de tamanho médio (Cohen, 1992). Este efeito diz-nos que se ignorarmos as restantes variáveis, podemos considerar que valores de LyE do grupo NPEF são significativamente diferentes daqueles apresentados pelo grupo PEF.

As maiores diferenças entre PEF e NPEF quanto à variável LyE são no eixo ML para ambas as situações (0,07 para olhos abertos e 0,07 para olhos fechados) e no eixo AP na condição de olhos fechados (0,07). 

 

Área BOS

Verificou-se que homens apresentam em média, valores mais elevados de Área da BOS (M = 607.50, DP = 95.20), do que mulheres (M = 518.21, DP = 90.24). Esta diferença é significativa (p = 0.00) e apresenta um efeito de tamanho médio a grande (r = 0.41). Estes resultados indicam que homens caracterizam-se por utilizar uma Área da BOS superior, quando comparados com mulheres.

Verificou-se que sujeitos PEF apresentam em média, valores mais elevados de Área da BOS (M = 557.48, DP = 88.93) do que sujeitos NPEF (M = 532.01, DP = 111.31). Esta diferença não é significativa (p = 0.275) e apresenta um efeito de tamanho pequeno (r = 0.13). Não encontrando diferenças significativas, assume-se que a Área da BOS é sensivelmente a mesma para sujeitos PEF e sujeitos NPEF.

Verificou-se que a relação entre a Área da BOS, α BOS e as medidas de Controlo Postural investigadas através do coeficiente de correlação Ró de Spearman não são significativas (p>0.05). O coeficiente de correlação apresenta valores muito reduzidos (r <.20) para todas as variáveis, à excepção da LyE_OA_ML (r = .21).

 

α BOS

Verificou-se que sujeitos do género masculino apresentam em média, valores mais elevados de α BOS (M=30.83, DP = 7.65) do que mulheres (M=29.78, DP = 8.08). Esta diferença não é significativa (p = 0.601) e apresenta um efeito de tamanho muito reduzido (r = 0.06). Não sendo encontradas diferenças significativas, assume-se que α BOS é sensivelmente o mesmo para homens e mulheres.

Verificou-se que sujeitos PEF apresentam em média, valores ligeiramente superiores de α BOS (M = 30.12, DP = 8.85) quando comparados com NPEF (M = 30.08, DP = 6.82). Esta diferença não é significativa (p = 0.982) e apresenta um efeito muito reduzido (r = 0.00). Sendo a diferença não significativa, assume-se perante estes resultados que α BOS é sensivelmente o mesmo para sujeitos PEF e sujeitos NPEF.

Verificou-se que a relação entre α BOS, a Área da BOS e as medidas de Controlo Postural investigadas através do coeficiente de correlação Ró de Spearman não são significativas (p > 0.05). O coeficiente de correlação apresenta valores muito reduzidos (r<.2) sugerindo uma associação muito fraca entre as variáveis (Pestana & Gageiro, 2008).

 

DISCUSSÃO

Sujeitos PEF são caracterizados por um perfil de controlo postural mais complexo, no qual se encontrou uma maior exploração de estratégias para a manutenção do equilíbrio quando comparados com sujeitos NPEF. As medidas estocásticas em estudo (EnAp e LyE) revelaram-se robustas quanto a alterações da Área BOS e α BOS.

Sujeitos PEF apresentam valores de ApEn significativamente aumentados quando comparados com o grupo NPEF. Estes dados indicam que que sujeitos PEF do projecto Saúde em Movimento apresentam um perfil de Controlo Postural mais complexo do que os sujeitos NPEF. Este incremento de complexidade das oscilações pode-nos indicar um Controlo Postural mais automático e menos restrito, com oscilações mais eficientes, característico de um sistema mais saudável (Borg & Laxaback, 2010).

A complexidade mais reduzida do grupo de sujeitos NPEF é indicativa de um sistema mais regular (menos complexo) que se revela mais rígido e fixo à repetição de padrões, demonstrando assim uma menor capacidade de sucesso na resposta às necessidades (Borg & Laxaback, 2010). Os valores de ApEn mais reduzidos, encontrados no grupo NPEF, podem ser explicados por uma maior atenção dedicada à manutenção do equilíbrio (Donker et al., 2007), resultando numa maior regularidade nas oscilações do CoP. Na mesma linha de raciocínio, valores de ApEn mais elevados podem demonstrar que o SCP requer menos atenção, conseguindo assim funcionar de forma mais automática (Stins et al., 2009).

Embora não significantes, foram encontrados valores de ApEn superiores para sujeitos do género masculino quando comparados com sujeitos do género feminino, demonstrando assim um perfil de Controlo Postural que se poderá caracterizar por ser mais regular. Podemos especular que o SCP de sujeitos do género masculino se caracteriza por ser mais rígido, apresentando uma maior repetição de padrões, nomeadamente quando comparado com sujeitos do sexo feminino.

Representada por valores de LyE mais elevados, sujeitos PEF parecem apresentar uma diversidade de estratégias (Deffeyes et al., 2009) significativamente mais elevada quando comparados com sujeitos NPEF. Desta forma e de acordo com Deffeyes, et al. (2009) parece que a maior exploração das estratégias de Controlo Postural do grupo PEF estarão associadas a um perfil de Controlo Postural mais saudável.

Embora a diferença não seja significativa, verificou-se que sujeitos do género masculino apresentam valores de LyE menores, quando comparados com sujeitos do género feminino. Esta diferença pode demonstrar um perfil de Controlo Postural de sujeitos do género masculino, caracterizado por uma menor diversidade de estratégias e consequentemente ligado a Controlo Postural menos eficiente.

Analisando as diferenças da Área da BOS entre sujeitos PEF e sujeitos NPEF não se verificam resultados significativos.

Verifica-se que sujeitos do género masculino apresentam uma Área da BOS significativamente superior a sujeitos do género feminino. Esta informação está de acordo com o estudo de Chiari, et al. (2002) que encontrou valores da Área da BOS significativamente superiores para homens, quando comparados com mulheres.

Os resultados da associação entre a Área da BOS e medidas de Controlo Postural dizem-nos que não há relações significativas.

 

CONCLUSÃO

 

  • Idosos Praticantes de Exercício Físico no projecto Saúde em Movimento, apresentam um perfil de Controlo Postural mais complexo e com uma maior diversidade de estratégias que pode estar associado a um perfil de Controlo Postural mais saudável.
  • A Prática de Exercício Físico parece contrariar de forma significativa a perda de complexidade e diversidade de estratégias do sistema de Controlo Postural.
  • A Entropia Aproximada e o Expoente Lyapunov são apenas sensíveis às acções do Sistema de Controlo Postural, apresentando robustez quanto a alterações na Área da base de Suporte e do ângulo formado entre os pés

 

Bibliografia e versão completa deste estudo:

 Caracterização do Perfil de Controlo Postural em Idosos através de Métodos Não Lineares.pdf (1,1 MB)

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